A amizade de Jô e Lenita, de A Gata Comeu

 

As irmãs e confidentes Jô (Christiane Torloni) e Lenita (Deborah Evelyn)

Torna-se claro, ao longo da trama de A Gata Comeu, que, para Ivani Ribeiro, a concepção de amizade corresponde a valores tais quais compaixão, franqueza e cumplicidade, cuja presença manifesta-se, por exemplo, nos papos bem-humorados de Zé Mário, Vitório e Tony, nas conversas despojadas da protagonista e o falso Conde e nos diálogos camaradas de Fábio e seu Martim. Relacionamento algum, contudo, envolve o imenso zelo e a profunda afeição inerentes ao companheirismo das irmãs de criação Jô e Lenita, que, apesar de suas personalidades distintas, visto que, enquanto a primeira revela-se romântica e impulsiva, a segunda denota-se – salvo sua decisão inconsequente de unir-se a Edson – pragmática e ponderada, demonstram, o tempo todo, necessitar dos conselhos, do apoio e do carinho uma da outra.

Com efeito, embora seja evidente o caráter sincero e despretensioso da singular amizade estabelecida entre a personagem principal e Ivete, não se pode negar haver uma sintonia única entre as filhas de Horácio, conforme atestam não só os momentos alegres partilhados pelas duas, mas sobretudo as situações angustiantes enfrentadas por ambas, como a partida de Lenita da casa paterna depois de seu casamento, ou por somente uma delas, como o longo desmaio que precedeu a amnésia da “gata”, evento que permitiu a “Dona Sensatez” expressar a mais terna e comovente preocupação que nutria pela irmã. De fato, se, ao lado desta, nos episódios críticos do desfecho da desastrosa festa dos artistas e da internação de Jô após seu acidente de carro, a caçula da família Penteado não esteve, isso apenas se deu porque ela havia sido impedida por pessoas mesquinhas  a saber, de modo respectivo, Edson e Gláucia  de oferecer ajuda e conforto a sua melhor amiga.

Não há dúvida de que sintetizam, com maestria, o forte vínculo existente entre tais personagens duas cenas da novela: aquela em que a protagonista, cheia de felicidade ante a maravilhosa correspondência de sentimentos de Fábio, informa o amado da necessidade de comunicar a boa-nova à irmã; e aquela em que Lenita, cansada da obtusidade do pai perante a verdadeira causa dos problemas emocionais da filha mais velha, não poupa Horácio de um discurso no qual lhe expõe, de forma resumida, porém, direta e incisiva, todos os erros por ele cometidos, ao longo dos anos, com relação a Jô. Ao passo que o turbilhão de emoções que dominam o coração da “gata” no dia em que o professor declara-lhe amor não a impede de lembrar-se de seu “Dr. Freud”, que, muito antes de Vitório, de Ivete e de Tony fornecerem, cada qual a seu modo, suporte e apoio a sua causa amorosa, já compreendia e devidamente orientava a irmã com respeito a sua postura ante o professor, Lenita, apesar do problemático casamento com Edson, que tomava muito de seu tempo (e de sua paciência), não arrefece seu zelo extremoso por Jô, conforme se pode constatar, por exemplo, na ocasião em que, expressando uma raiva que não é habitual, deseja que Fábio "se dane" por preferir acreditar na carta forjada por Gláucia a crer na inocência da amada. Afinal de contas, "amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração".


– Karen Monteiro

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