O valor curiosamente inestimável do dia a dia
Diálogos frequentemente inusitados, aliados a enredos ágeis, são combinados a considerações reflexivas e até filosóficas, pontuadas por sátiras, o que conduz em geral a desfechos inesperados as crônicas do escritor gaúcho Luis Fernando Verissimo (1936-), atento e perspicaz observador não apenas das idiossincrasias da cultura brasileira, como também das peculiaridades da natureza humana. Assim se revela a essência das narrativas da compilação Comédias da Vida Privada: 101 Crônicas Escolhidas, lançada, em 1994, pela editora L&PM, cuja leitura garante prazerosos momentos àqueles que têm, além de disposição (muito) bem-humorada, percepção sensível dos hábitos e das manias, dos valores e das excentricidades, dos sentimentos e das neuroses e dos pensamentos e das complexidades expressos, em seu dia a dia, por homens e por mulheres comuns.
Sem dúvida, o adjetivo “privada”, fora o fato de referir-se a situações usuais do cotidiano das pessoas, pode assumir o significado de trivial ou descartável, embora os aspectos corriqueiros da existência humana sejam no íntimo as facetas mais fascinantes e instigantes de toda a vida, coisa que se destaca nos retratos rotineiros que, devidamente categorizados em sete tópicos distintos – a saber, Fidelidades & Infidelidades, Encontros & Desencontros, Eles &/Ou Elas, Família, Pais & Filhos, No Bar e Metafísicas –, Verissimo cria em textos tais quais “A Aliança”, “Trapezista”, “Sala de Espera”, “A Volta(I)/A Volta(II)”, “Lar Desfeito”, “Escalões”, “Tu e Eu”, “Tios”, “Caixinhas”, “Festa de aniversário”, “A Descoberta”, “O Mundo Restaurado”, “A Verdade” e “O Homem Que Desapareceu no Prado”. De fato, essas crônicas desnudam o talento da alma introspectiva de seu criador, responsável por desmistificar, a exemplo de figuras do meio literário como o escritor colombiano Gabriel García Márquez e a poetisa norte-americana Emily Dickinson, a tibieza de espírito comumente associada aos tímidos, permitindo ao mundo enxergá-los de acordo com suas propensões e com seus intelectos complexos e surpreendentes.
– Karen Monteiro
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